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20090420

arRebatamento?...

Isso já não sei. Já esqueci!
Aqui só há o tempo a passar. O mesmo apascentar os dias à volta do redil onde se morre todas as noites, a esquecer.
Lembrar de esquecer todos os dias, à noite, para que assim saiba o que há para saber.
Só esquecendo se pode saber.
Saber, mais que imaginar.
Saber o espanto quando o tempo cessa. E o tempo cessa!

Não, não! Não é o silêncio que traz o espanto.
A brutal ausência de som! De certo modo é como se fosse esperada. O silvo fino que julguei ser o som do tempo a passar, fiel companhia do tímpano, quase imperceptível e que de repente se cala.
Impressiona, mas não se compara ao que mais espanta!

Não é a treva. Não, não é! Nem tal coisa existe.
Será antes o entendimento da luminosidade que se apaga num processo intemporal. Tal como o súbito cerrar de olhos onde o negro é afinal um lento pejar de cores, volutas que se modelam aos impulsos do nervo óptico. É como se as cores se degradem nos pigmentos que as compõem e sem que no entanto haja forma ou movimento. É como se revelasse um fundo vibrante composto por todos os tons, que se confundem e que se fundem no mesmo fundo. Incolor, denso... Imaterial.
Difícil será imaginar, mas não tão intangível como aquele que nem ao espanto lembra!

Nem olfacto, nem palato, que ainda o tempo era cedo e já caíam, na pressa de esquecer por não haver lugar sequer para o tempo de lembrar. Há quem diga que se morre devagar, desde o primeiro choro. Estes, se assim não é, cedo começam a morrer por cedo se achar que se começa a fazer tarde.
Tarde ou nunca se saberá quantos sabores serão cheiro. E de ausência já nem lembra, de entre as outras que se vão.

Será o toque da pele que se vai num estranho vazio entranhado?
Não é tanto o pasmo de não haver tacto, pois nem sentido faz haver o que haja a tactear. Não é o deixar de ser a fronteira dos pés e o estremo de cada mão, nem a ausência da rigidez que finalmente se percebe em cada articulação. Nem a vertigem de quem já não tem horizonte nem ponto zero, de quem já não tem cabeça nem ondula respiração. De quem já não sente o sangue a correr.
Não há imaginação para além da implosão do corpo condensado no umbigo e este finalmente desvanecido.
Não! Não há maior espanto!
Nada maior que o fim da dor!
A dor!

Não há dor!
Não há o peso da dor! O que lentamente aprendermos a suportar no hábito de mais carregar.
Aprendemos tão bem a dor lenta, tão subtil e crescente, que mais não cremos que venha a ser dor. E em cada passo adiante será tomada dor nova como constante de mais uma prova, a refrega de vida na dor a domar. E tão subtil é a ilusão de que a dor é domada que nada se toma por afeição, nada se entende por mais, mas sim por menos. É neste vício de dor superada que mais se suporta, mais peso que se carrega apertando a curvatura que por dentro nos verga.
Não! Não imaginamos a ínfima parte do peso da dor que se carrega.

Imagem e desejo. Imaginar o sentido no tempo que cessa.
É recorrente a ideia de que, sem o peso da dor, só existe um sentido...
Ascensão.

1 comentário:

Anónimo disse...

nao sei se o dia de ontem inspirou a blogosfera, mas hoje só tenho lido do melhor !

bom fim de semana :)